Rubens Bernardo Tomas

O Movimento Gay no Nordeste

O movimento gay no Nordeste do Brasil tem uma trajetória rica, marcada por resistência, criatividade e enfrentamento das múltiplas violências estruturais da região. Apesar das dificuldades impostas por contextos conservadores, religiosos e econômicos, o movimento LGBTQIA+ nordestino teve (e tem) papel fundamental na luta pelos direitos civis e na afirmação das identidades sexuais e de gênero no Brasil.
1. Contexto histórico e social
O Nordeste sempre foi uma região marcada por fortes tradições religiosas e conservadoras. Isso influenciou diretamente a repressão a expressões de sexualidade dissidente. Apesar disso, os corpos dissidentes existiram e resistiram desde os tempos coloniais especialmente nas festas populares, no teatro, nos terreiros e nas ruas.
2. Primeiras manifestações (anos 70 e 80)
Na esteira dos movimentos pela redemocratização do Brasil, surgiram também as primeiras organizações LGBTQIA+ na região.
Em Salvador, em 1980, foi criado o Grupo Gay da Bahia (GGB), por ativistas como Luiz Mott. É considerado o grupo LGBT mais antigo em atividade no Brasil.
O GGB teve papel fundamental na visibilidade nacional do movimento, promovendo denúncias de violências, homofobia institucional e lutando pela cidadania plena.
Nesse período, as principais ações eram educativas e jurídicas, buscando o reconhecimento da dignidade das pessoas LGBTQIA+.
3. Anos 90 – Expansão e visibilidade
Com o fortalecimento de ONGs e coletivos, o movimento se expandiu para outras capitais como Recife, Fortaleza, João Pessoa e São Luís.
Surgem coletivos universitários, movimentos culturais e grupos de resistência em comunidades e periferias.
A Abertura das Paradas do Orgulho LGBT, mesmo enfrentando resistência, começou a acontecer em algumas capitais nordestinas, com destaque para Salvador e Recife.
4. Anos 2000 – Cultura, resistência e enfrentamento
A cultura virou uma das maiores formas de resistência. A música, o teatro, o audiovisual e os blocos carnavalescos passaram a incluir pautas de diversidade sexual com força.
Aparecem nomes como Karol Conká, Majur, Liniker e Johnny Hooker, muitos deles do Nordeste, como figuras públicas e símbolos de resistência.
O movimento travou disputas importantes contra a LGBTfobia institucional e religiosa. Muitas lideranças locais passaram a ocupar espaços políticos e sociais.
5. Lutas contemporâneas
O Nordeste hoje concentra alguns dos mais importantes festivais LGBTQIA+ do país, como o Nordestina Queer, o Festival Rec-Beat (com programação LGBT) e movimentos como o Batekoo e o Afrobapho.
Ainda assim, é uma das regiões com maior número de homicídios de pessoas LGBTQIA+, especialmente de pessoas trans e negras.
Os movimentos atuais têm foco interseccional: articulam sexualidade com raça, gênero, classe e território.
Muitos coletivos atuais são liderados por pessoas trans, travestis, negras e periféricas, como o Coletivo AMEM (PE), o TransViver (BA) e o Coletivo Juntas! (PB).
Conclusão
O movimento gay (e LGBTQIA+) no Nordeste não apenas resistiu às opressões históricas, como também reconfigurou a forma de lutar, sendo marcado por sua carga afetiva, estética, cultural e política. A resistência nordestina se dá tanto nas universidades quanto nas ruas, nos terreiros, nos palcos e nas redes sociais, mostrando que ser LGBTQIA+ no Nordeste é um ato profundo de coragem e criação.
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