QUANDO SUA SOMBRA TE VISITA

Livro online – Capítulo 2

O que você esconde também te procura

Subtítulo: Sobre o preço de fingir que não dói

Durante muito tempo, eu só queria entender.
Queria mapear cada dor, encontrar a origem, fazer um gráfico emocional das tragédias.
Pensava que, entendendo tudo, a dor ia embora.
Mas não foi.

Porque dor não é fórmula.
Dor é grito.
E às vezes, o grito é surdo.

Eu me tornei boa em fingir.
Sorriso encaixado, respostas prontas, espiritualidade performática.
Fazia orações com voz doce, mas por dentro tremia.
Fazia promessas ao universo, mas não me prometia nada.
Fazia de conta que estava curada.
Mas era só medo de ser vista em carne viva.

A sombra visita primeiro como incômodo.
Depois como sabotagem.
E, se ignorada, vem como ruína.
Porque o que você esconde
também te procura.

Não é castigo.
É retorno.

A dor não quer te punir.
Quer ser ouvida.
Quer ser olhada com o mesmo amor que você oferece ao outro.
Quer ser reconhecida como parte, não como inimiga.

A sombra não precisa ser vencida.
Precisa ser incluída.
Com limites, sim.
Mas com verdade.

O problema não é sentir tudo.
É fingir que não sente.
É manter o ritual vazio quando o coração está em cacos.
É responder "tá tudo bem" quando tudo está ruindo por dentro.

Quando você se nega à própria dor,
ela vai embora.
Mas volta como cansaço, como desânimo, como doença, como cinismo.
Volta em forma de dureza.
Volta nos relacionamentos onde você repete as mesmas escolhas,
esperando resultados diferentes.

Até que um dia você senta.
E diz, sem truque:
"Tá doendo, sim."
"Eu tô cansada de fingir que não."
"Eu não aguento mais sustentar o personagem."

É aí que a sombra muda de nome.
Deixa de ser assombração
e vira parte do corpo.
Vira memória que respira,
não fantasma que grita.

Neste livro, não te prometo uma luz constante.
Prometo uma vela.
Uma faísca.
Um espelho limpo o bastante pra você se ver sem disfarce.

Porque a travessia não é sobre virar luz.
É sobre parar de fugir do escuro.
É sobre olhar para o que doeu,
e dizer com firmeza:

“Você faz parte. Mas você não manda mais em mim.”