Maude Salazar

A dor de se encolher para caber no amor do outro
JE ME SUIS FAIT TOUT PETIT

Je me suis fait tout petit
(Me fiz todo pequeno)
O encolhimento invisível no amor
Esta é uma história inspirada na canção Je me suis fait tout petit, de Georges Brassens, onde um homem se encolhe diante de uma mulher-boneca que o encanta e o domina. Mas, aqui, a canção se torna espelho para algo que tantos de nós já vivemos: a dor de diminuir-se para caber no amor de alguém.
Encolher-se não acontece de repente. É um desfiar lento. Primeiro, deixamos de dizer algo para evitar conflito. Depois, sorrimos para disfarçar o incômodo. Passo a passo, vamos cedendo pequenos pedaços de nós. E chamamos isso de cuidado. Mas, lá no fundo, é medo, medo de ser abandonado, medo de ser grande demais para caber no mundo do outro.
Também existe o outro lado: o de quem para se proteger, quer o outro pequeno. Não por crueldade, mas por já ter se ferido tanto que confunde segurança com controle. E aí começa a aparar gestos, opiniões, sonhos… tudo para que a relação não ameace as paredes que construiu para sobreviver.
Quando isso acontece, já não é amor, é um pacto com a ausência. É um jogo silencioso onde um respira pela metade e o outro se contém até quase desaparecer.
No fundo, é como se a alma tivesse aprendido que amor só existe quando cabe num espaço apertado. Mas o amor verdadeiro é o contrário: ele abre espaço, convida, expande. Ele permite que sejamos inteiros e que o outro também seja inteiro.
O encontro real só acontece quando ninguém mais precisa se encolher para ficar. Quando podemos existir sem pedir desculpas pela nossa voz. Quando ocupamos nosso próprio espaço interior e, de lá, olhamos para o outro não como ameaça ou prisão, mas como presença que caminha ao lado.
Talvez seja aí que a música muda de tom: quando o “me fiz pequeno” se transforma em “me permiti inteiro”.
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